A principal função dos rins é filtrar o sangue eliminando substâncias nocivas ou que estejam em excesso no organismo.
Os cálculos renais, urolitíase ou as populares “pedras nos rins” são compostos minerais formados a partir da filtração de substâncias pelos rins.
Dentre os componentes eliminados pelo rim estão vários minerais como: ácido úrico; oxalato; cálcio; fosfato; magnésio e outros. O desequilíbrio entre a concentração destes minerais e a quantidade de urina produzida, predispõe a precipitação dos mesmos, formando os “cristais”. Em seguida, por um processo chamado nucleação, os cristais se agrupam gerando o cálculo renal.
A formação de cálculos renais é um processo silencioso, podendo levar vários anos até surgirem os sintomas, os quais estão relacionados com a localização do cálculo na via urinária e os efeitos decorrentes de sua movimentação.
Quando alojado no interior do rim é habitualmente é indolor, porém, pode predispor a infecções urinárias de repetição e até mesmo, a episódios de sangramento na urina (hematúria).
As tão temidas cólicas renais acontecem quando o cálculo se desloca para o ureter (um canal longo e estreito que comunica o rim com a bexiga), e é provocada pela obstrução do ureter e dilatação de todo o trato urinário superior. A dor é tipicamente lombar, em um dos lados e se irradia para a região anterior do abdome, podendo atingir os testículos no homem e a vagina na mulher. Comumente pode ser acompanhada de náuseas, vômitos e sudorese.
A presença de febre e calafrios deve levantar a suspeita de infecção urinária, condição que poderá exigir tratamento imediato para desobstrução das vias urinárias e ação adequada dos antimicrobianos.
Em caso de obstrução dos ureteres nos dois lados, poderá ocorrer diminuição ou até parada da eliminação de urina.
Você já deve ter ouvido falar que para evitar cálculos renais é necessário beber bastante água. Os cálculos renais são formados a partir da supersaturação de sais na urina. Com isso, se a urina está muito concentrada, com pouco líquido e muitos sais, estes se precipitam formando os cálculos. Logo, ao manter-se bem hidratado favorece a diluição dos cristais na urina, evitando a formação dos cálculos.
No entanto, não é somente a quantidade de água ingerida que vai determinar se o paciente terá ou não cálculos renais. Existem várias alterações metabólicas que promovem um desequilíbrio na eliminação dos minerais e aminoácidos na urina, predispondo a formação dos cálculos. Muitas vezes a causa pode estar bem distante do rim, como por exemplo, os pacientes com distúrbios das glândulas paratireoides, localizadas no pescoço. Dentre as alterações mais comuns destacam-se o excesso de cálcio, oxalato, fosfato, ácido úrico e cistina, além da diminuição da concentração de citrato. Alterações do PH urinário e até mesmo infecções urinárias também podem influenciar na formação de cálculos.
A partir da investigação minuciosa, o urologista é capaz de identificar as alterações e corrigi-las, evitando a formação de novos cálculos e o crescimento dos cálculos já presentes.
A principal complicação dos cálculos renais é a obstrução das vias urinárias, quando ele se desloca do rim para o ureter. Além da mencionada cólica renal, que de tamanha intensidade, muitas vezes é comparada à dor do parto, a obstrução também leva a elevação da pressão no interior do rim, o que prejudica o funcionamento renal, podendo levar à morte suas células e a perda da função renal. Quando não tratada poderá culminar em insuficiência renal com necessidade de diálise.
A urina parada acima do ponto de obstrução, predispõe a ocorrência de infecções urinárias, pois facilita a aderência e multiplicação das bactérias, que porventura tenham entrado na via urinária. Neste caso, o tratamento deve ser imediato.
Os cálculos renais podem causar dano ao paciente, mesmo quando não estão obstruindo o ureter. O principal exemplo são os cálculos de estruvita, que são formados a partir de bactérias e levam a infecção urinária de repetição.
A presença de cálculos na bexiga poderá causar uma irritação crônica em suas paredes, aumentando a incidência de tumores de bexiga.
Muitas pessoas me perguntam se existe algum remédio que “dissolva a pedra” e a resposta é: depende da pedra. Existe uma ocorrência rara que são os cálculos puros de ácido úrico. Esse tipo de cálculo é formado em um ambiente muito ácido e ao elevar o ph da urina, pode até mesmo ser dissolvido. Porém trata-se da minoria dos casos.
O que é muito importante na avaliação do paciente formador de cálculos é o diagnóstico correto da causa, por meio da investigação metabólica. A partir daí é possível fazer uso de algumas medicações para correção de transtornos específicos, evitando assim o crescimento e formação de novos cálculos.
Deve-se avaliar a possibilidade de tratamento cirúrgico de cálculos renais, sempre que houver obstrução das vias urinárias associada a algum dos fatores abaixo:
Infecção urinária;
Alteração da função renal;
Dor refratária a analgesia;
Cálculos maiores com baixa probabilidade de eliminação espontânea;
Alteração anatômica das vias urinárias;
Obstrução persistente refratária ao tratamento clínico;
Mesmo cálculos não obstrutivos, muitas vezes, merecem tratamento cirúrgico para evitar possíveis complicações. É o caso de cálculos volumosos, com baixa probabilidade de eliminação espontânea ou em pacientes com alterações anatômicas das vias urinárias e infecção urinária de repetição.
Existem várias cirurgias para tratamento dos cálculos renais, variando de acordo com a localização e tamanho do cálculo, a anatomia do paciente e também dos recursos disponíveis.
A cirurgia de ureterolitotripsia rígida, ou uretero rígida, é utilizada para tratamento de cálculos ureterais.
É um procedimento endoscópico, realizado pelo canal da urina, e sem nenhum corte na pele do paciente, assemelhando-se a outros procedimentos endoscópicos como, a endoscopia digestiva alta e a colonoscopia.
A duração do procedimento é variável, mas dificilmente passa de 60 minutos.
Neste procedimento o médico urologista introduz no canal da uretra um aparelho com câmera na ponta, que possibilita visualizar a via urinária por dentro. Após identificado o orifício onde o ureter entra na bexiga, são passados dois fios, que servem de guia por onde o aparelho irá deslizar até chegar no local onde está o cálculo. Identificado o cálculo, ele é estilhaçado e os fragmentos são retirados com um dispositivo, que se assemelha a uma rede, chamado Dormia.
Após a retirada de todos os fragmentos significantes é colocado um cateter duplo jota, que permite a eliminação de pequenos fragmentos e coágulos, além de garantir uma cicatrização adequada no local onde o cálculo possa ter machucado.
Apesar de ser o procedimento urológico mais realizado, a uretero rígida tem algumas limitações. A primeira limitação está relacionada à anatomia do próprio paciente. Pessoas mais jovens, do sexo feminino, de menor estatura e com cálculos obstrutivos mais próximos do rim do que da bexiga, tem uma tendência natural de ter o calibre do ureter mais fino, e muitas vezes esse calibre é menor do que o próprio aparelho, impedindo a progressão do mesmo. Nestas situações é necessário a colocação do cateter duplo j para dilatação do ureter e em um segundo momento, realizar a abordagem do cálculo.
Outra limitação da uretero rígida está relacionada ao próprio aparelho. Neste procedimento é utilizado um ureteroscópio rígido, que é uma estrutura reta. Portanto, quando o paciente apresenta tortuosidades do ureter ou o cálculo está alojado nos cálices renais, é inviável tentar acessa-lo com este aparelho. Em algumas situações durante a fragmentação do cálculo ele pode ter uma migração para o interior do rim tornando-se inacessível ao ureteroscópio rígido e impedindo a retirada da pedra. Caso isso acontece, coloca-se um cateter duplo j e após dilatação do ureter realiza-se uma ureterolitotripsia flexível.
Apesar de ser um procedimento minimamente invasivo e muito seguro, a uretero rígida tem riscos de complicações como qualquer procedimento. A mais comum delas é a infecção urinária, que muitas vezes não está relacionada ao procedimento em si, mas ao paciente já estar com quadro de infecção incipiente, agravado pela obstrução. Nestas situações, o tratamento é feito com antibioticoterapia. Pode ocorrer também, sangramento na urina que está relacionado ao dano causado à parede do ureter pela própria pedra, além, da passagem do aparelho e da presença do duplo jota. Felizmente, a maioria dos sangramentos são de pequena intensidade e não colocam o paciente em risco de instabilidade hemodinâmica ou anemia.
A Ureterorenolitotripsia flexível ou “uretero flexível” também é um procedimento endoscópico minimamente invasivo usado para o tratamento de cálculos ureterais e renais.
O uso do ureteroscópio flexível permite o urologista alcançar cálculos em posições onde o ureteroscópio rígido não alcança por ter uma deflexão na extremidade.
Com o desenvolvimento tecnológico, os aparelhos têm possibilitado grandes melhorias relacionadas ao campo da visão, manuseio e capacidade de fragmentação dos cálculos. Desta forma a maior parte das cirurgias para tratamento de cálculos renais passaram a ser realizadas por esta técnica.
O procedimento inicia-se com a passagem do fio guia pelo ureter, seguido de uma bainha ureteral, que é um tubo de poliuretano, com a finalidade de manter uma via direta entre o interior do rim e o meio externo, diminuindo o dano à parede do ureter. Esta bainha ureteral, também garante uma irrigação renal com baixa pressão, minimizando o risco de passagem de bactérias da urina para a corrente sanguínea.
A fragmentação do cálculo é feita com o uso do laser de holmium, e após retirada de todos os fragmentos significantes é colocado o cateter duplo j.
A nefrolitotripsia percutânea é um procedimento utilizado para o tratamento de cálculos mais volumosos, habitualmente maiores que 2cm. Diferentemente dos anteriores, este procedimento é realizado por meio de um orifício nas costas do paciente, de cerca de 1cm, por onde é feito um trajeto que comunica o interior do rim com o meio externo. Por este caminho, o urologista introduz o nefroscópio e realiza a fragmentação do cálculo e retirada dos fragmentos.
Na maioria dos casos, também se opta pela colocação do cateter duplo jota ao final do procedimento. Em alguns casos, o paciente poderá permanecer temporariamente com uma sonda de nefrostomia saindo pelo orifício nas costas, onde foi realizado o procedimento. Para prevenir uma possível retenção urinária, a sonda vesical também é colocada.
Habitualmente, a nefrostomia e a sonda vesical são retiradas no dia seguinte após a cirurgia e o paciente recebe alta no segundo dia de pós operatório.
Por ser um procedimento percutâneo e não totalmente endoscópico, a nefrolitotripsia carrega um risco maior de sangramento do que os outros procedimentos. O risco de infecção também existe, como em qualquer procedimento na via urinária. Por ser realizado baseado em orientações anatômicas e não por visão direta, existe o risco de lesão de órgão adjacentes ao rim, como o colon. Este risco é maior em paciente com cirurgias abdominais prévias e alterações anatômicas. Para realização deste procedimento é fundamental um estudo prévio da anatomia do paciente com tomografia de abdome.
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